3.2.21

O inferno são...

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"Tudo bem?"

"Na verdade, sim. Tenho me alimentado bem, bebido muita água, me exercitado e agora tenho obrigações de verdade. Então, você sabe, indo bem."

"Então qual o problema?"

"Os outros."

"Elabore."

"A dor dos outros."

"Te incomoda?"

"Não me deixa dormir. Eu imagino que os outros estejam sofrendo, então eu sofro."

"Alguém te disse que estava sofrendo?"

"Na verdade não. Mas é o tipo de coisa que eu sinto. Que nem algumas pessoas conseguem sentir cheiro de barata, eu consigo sentir quando tem alguém sofrendo."

"E quem está sofrendo?"

"Todo mundo? Em algum grau. Minha mãe, mais que tudo."

"O que há com ela?"

"Trabalho. Acho que ela pensa que trabalhar é a única coisa que torna uma pessoa digna, então ela deixa se consumir. Ela está tentando, mas eu não sei..."

"E por que isso te diz respeito?"

"É uma boa pergunta. Eu não sei. Mas eu sinto que é minha responsabilidade melhorar as coisas. Ou pelo menos não piorar. Mesmo que isso me custe caro."

"Não deve sair barato, mesmo."

"É, mas tem que ser feito. Alguém tem que fazer. Se não for eu, quem?"

"Seu pai?"

"Não acho que meu pai saiba como. Ele não sente o cheiro. Ele também sofre."

"E o que acontece?"

"Os dois estão cansados. E com dor. O tempo todo. E eu sou obrigada a assistir."

"Por que você não olha pra outro lugar?"

"O que isso diria sobre mim?"

"Que você tem algum senso de autopreservação."

"Seria mentira."

"Então você não pode ser feliz?"

"Não em voz alta. Mas em voz baixa, na verdade eu também acho que não sou. Não de verdade."

"O que te falta?"


"Os outros."

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